Maior reflexo da queda nos juros é no crédito imobiliário

Publicado pelo Estadão - 


 


Financiamentos para o consumidor final ainda não refletem a queda da Selic - Texto: Renato Jakitas


 



Com a última decisão do Comitê de Política Monetária Nacional (Copom), a taxa básica de juros, a Selic caiu 10 pontos porcentuais em um espaço de 28 meses – saindo de 14,25% para os atuais 4,25% ao ano. O novo patamar muda a vida do investidor, que tem visto seu dinheiro render menos na renda fixa, e em tese deixa mais fácil a vida do tomador de empréstimo, que conta com linhas mais acessíveis no mercado. Mas isso vem mesmo ocorrendo?




Em teoria, sim. Os gráficos apontam que está mais barato pegar dinheiro emprestado. Na prática, pouca gente percebe essa nova realidade. Isso porque o crédito no Brasil caiu de um patamar que os economistas classificam de “extremamente alto” para “muito alto”. Das linhas de financiamento pessoal, só a de aquisição da casa própria e, em menor escala, a de compra de automóveis novos seguem o ritmo de queda da taxa Selic.



Desconsiderando essa duas modalidades de financiamento – o imobiliário e automotivo –, o crédito para pessoa física ficou 26,56% mais barato no Brasil desde o início do atual ciclo de corte da Selic, iniciado em 2016, segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac).




Miguel de Oliveira, que dirige a entidade, diz que é natural que os bancos operem bem acima da Selic para o consumidor. Segundo ele, o crédito imobiliário cai mais rápido porque o tomador dá o imóvel como garantia. “Se não pagou, o banco toma”, diz. Nos demais, outras variáveis importam até mais que a taxa básica de juros.



De forma geral, diz Oliveira, as pessoas superestimam a Selic na formação dos preços no mercado financeiro. “A Selic é importante, mas é só um fator que impacta na hora de definir o preço do crédito”, aponta. “É como se eu fosse comprar uma camiseta. Eu pago pelo tecido, pela costureira, pelo transporte. No crédito, além da Selic, tem o risco de inadimplência, tem o depósito compulsório do banco, tem muitas outras coisas.”


Para Juliana Inhasz, economista e professora do Insper, falta também concorrência no mercado. “A gente não está vendo essa redução da Selic chegar para o consumidor final. Mas o mercado é muito concentrado”, afirma. O Banco Central aponta que os cinco principais bancos do País (Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa) respondem por 85% do volume de crédito.


Os especialistas não esperam grandes mudanças nesse cenário, mesmo que a Selic volte a cair neste ano. Segundo eles, uma queda mais acentuada nas modalidades de crédito pessoal depende da retomada econômica. “Aumento do PIB e melhora do emprego são os fatores que afetam o crédito”, afirma o superintendente executivo de negócios imobiliários do Banco Santander, Paulo Duailibi.


 


Redução de taxa impulsiona portabilidade de dívida imobiliária



No ano passado, troca de dívida mais cara por outra mais barata cresce 175%




O recente ciclo de queda da taxa Selic fez com que o crédito para habitação saísse de uma taxa de quase 11% ao ano em 2016 para 7,5% agora, de acordo com a média dos contratos dos cinco principais bancos levantada pela fintech Melhor Taxa.




Como efeito prático, a nova onda de queda nas taxas para o financiamento imobiliário aqueceu a portabilidade de dívida no setor – ou seja, a troca de um financiamento mais caro por um mais barato. Segundo os dados mais recentes do Banco Central, de janeiro a novembro de 2019 a transferência de dívida imobiliária para outro banco somou R$ 1,46 bilhão, um crescimento de 175,43% em relação ao mesmo período de 2018.



Se considerados apenas os dados de novembro do ano passado, 1.094 pessoas transferiram suas dívidas. O montante total de crédito que migrou para outras instituições somou R$ 250,8 milhões, um aumento de 367,02% em relação ao mesmo mês de 2018. A média das taxas cobradas em novos financiamentos estava em 7,2% ao ano. Cinco anos antes, em novembro de 2014, era de 9,3%.




Segundo Miguel de Oliveira, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), a troca pode valer a pena se a taxa do novo crédito imobiliário estiver 0,5 ponto porcentual mais em conta do que a contratada no passado.




No entanto, para saber se, de fato, levar o financiamento para outra instituição financeira é um bom negócio, é preciso atentar ao chamado Custo Efetivo Total (CET) do financiamento imobiliário.




Neste cálculo entra não apenas a taxa de juros praticada pelo banco, mas também os seguros por morte e invalidez permanente incluídos no financiamento. Outro custo a ser observado é a taxa de administração das contas envolvidas.


“Essas taxas têm um impacto importante na prestação porque variam de seguradora para seguradora. Elas são baseadas no prazo do financiamento e na idade do contratante”, explica Sérgio Cano, professor do MBA em Gestão de Negócios Imobiliários da Fundação Getúlio Vargas. Para Cano, o confronto de taxas de juros é benéfico à concorrência entre instituições e alivia custos ao consumidor. Ele afirma, porém, que a portabilidade ainda não é tão utilizada quanto poderia no País. “Muita gente ainda não procurou e não despertou para isso porque não tem informação”, acredita.



SIMULAÇÃO




Na ponta do lápis, quem fez um financiamento de R$ 300 mil com prazo de quitação de 360 meses (30 anos), a uma taxa de 10,8% ao ano, pode economizar até R$ 137 mil fazendo a portabilidade agora (ver quadro abaixo).




No limite da diferença, entre o financiamento mais caro de 2016 (11,65%, do Santander) e o mais barato de hoje (6,5% da Caixa), a diferença total é de R$ 214.642. A economia mensal pode chegar a quase R$ 600.




Mas a economia tem seu preço: o cliente está sujeito aos custos de avaliação do imóvel e do registro no cartório depois da portabilidade. Todo esse processo sai em torno de R$ 3,7 mil para uma casa avaliada em R$ 500 mil na cidade de São Paulo.




Por isso, para o planejador financeiro Carlos Castro, da Planejar, antes de levar a dívida para outro banco, é importante tentar negociar o contrato com a instituição atual. “Sempre tente negociar. Banco não gosta de perder cliente, ainda mais cliente de crédito imobiliário, que tem um relacionamento de longo prazo com a instituição”, afirma.







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