Com Selic a 4,25% ano, veja o que fazer com seus investimentos

Publicado pelo Valor Investe - Fim do ciclo de corte de juros muda as perspectivas sobre taxas de juros e força o investidor a repensar estratégias - por Isabel Filgueiras


 


Mais uma vez, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu pelo corte da taxa básica de juros, a Selic, de 4,50% para 4,25% ao ano ontem. Esta é a quinta redução consecutiva desde julho do ano passado. Para o pequeno investidor, a nova taxa significa uma rentabilidade ainda mais miada na renda fixa.


 


Se quando a taxa de referência ainda estava a 4,5% muitos fundos DI e a poupança já perdiam para a inflação, imagina agora? Mas sempre há, de um jeito ou de outro, pelo menos um modo de tirar um pouco desse prejuízo.


 


O outro lado da história é que, na teoria (se assim os bancos quiserem), as taxas de empréstimos também podem cair. Não na mesma proporção que a Selic, que fique bem claro, mas um pouco. O cenário também provoca investidores a diversificar e se arriscar mais, o que acaba aumentando a liquidez (facilidade de compra e venda de ativos) de aplicações da renda variável, como a bolsa e fundos imobiliários.


 


Ao que tudo indica, este deve ser o último corte deste ciclo de redução, que começou há dois anos, quando a taxa ainda era de gordos 14,25% ao ano. Enquanto a economia não engatar e a inflação estiver sob controle, a taxa de 4,25% deverá reger as operações financeiras neste ano.


 


Ainda não há como prever o que será daqui para frente, mas o fim deste ciclo pode ser o começo de um outro, com gradativo aumento dos juros. E isso muda as expectativas para as aplicações de curto, médio e longo prazo que dependem da Selic.  


 


Renda fixa


 


Quem quiser reduzir o impacto dessa política de corte de juros vai precisar fazer algumas mudanças na carteira. Na renda fixa, especialistas orientam a sair da zona de conforto dos títulos públicos (exceto quando se tratar da sua reserva de emergência).


 


Um modo de fazer isso é aumentar o risco de crédito, partindo para títulos privados, que não são tão seguros como os títulos do governo, mas que costumam pagar mais em juros. Mas fique sempre atento à liquidez, os prazos (data para resgatar o dinheiro) e, claro, a reputação das empresas das quais você compra títulos.


 


Se você não entende de empresas ou não tem tempo para pesquisar, o melhor talvez seja investir em fundos de títulos privados. Dessa forma, um gestor vai fazer este trabalho por você, em troca, claro de uma taxa de administração.


 


Outra maneira de aumentar um tiquinho a rentabilidade da renda fixa é exercitar a paciência. Aumentar o prazo dos títulos gera risco, mas costuma oferecer juros um pouco mais interessantes, que batem a inflação.


 


De acordo com o planejador financeiro certificado (CFP) pela Planejar, Jayme Carvalho, títulos públicos prefixados remuneram pouco e podem trazer prejuízos. Embora o cenário não seja de probabilidade de alta da taxa de juros num futuro próximo, isso pode, sim, acontecer.


 


Neste caso, quem tem títulos prefixados a uma taxa baixa acaba perdendo. Primeiro porque quando a Selic sobe, o preço do título cai e gera prejuízo para quem quer vender antes do vencimento. Segundo porque, mesmo que mantenha até o vencimento, você acaba tendo rentabilidade menor que os títulos regidos por uma taxa de juros mais alta. Por isso, a ideia é evitar os prefixados nesse momento.


 


Apesar de estar com retorno magrinho, a renda fixa tem seu valor. “É preciso que o investidor veja a carteira como algo único e entenda que a renda fixa compensa possíveis perdas na renda variável, que por sua vez pode ter uma rentabilidade muito maior”, afirma o planejador.


 


Para não perder poder de compra, com investimento de rentabilidade abaixo da inflação de 3,4% projetada pelo Boletim Focus, Carvalho sugere que faça o balanceamento da carteira com CDBs que paguem acima de 105% do CDI ou LCI e LCA (isentos de imposto de renda) que remunerem pelo menos 85% do CDI.


 


Há alguns meses, o Tesouro IPCA+ 2024 foi um dos mais indicados no momento de corte de Selic. Mas agora, com um espaço cada vez menor e mais improvável de corte de juros, ele pode já não ser tão interessante.


 


Segundo o sócio da assessoria de investimentos Monte Bravo, Rodrigo Franchini, o que o título oferece hoje, taxas de cerca de 2% mais inflação, é muito pouco para um prazo de quatro anos. Ele argumenta que 2021 deve ser um ano de ajustes, possivelmente com algum aumento da inflação e consequentemente da taxa de juros, logo este título (Tesouro IPCA+2024) corre o risco de ficar defasado rapidamente.


 


“A curva mais curta de juros é a que mais sofre ajuste por parte do mercado. Eu procuraria um título com um somatório total de juros de mais de 6% (juros mais inflação). Inevitavelmente você vai encontrar isso em títulos de médio prazo, de seis ou oito anos. Em 2026, a curva de juros futuros já vai facilmente para 6,5% ao ano, então em um ano e meio esse título pode ficar defasado na carteira. Por isso, também não fixaria em nada tão longo no momento, como 30 anos”, diz.      


 


É hora de vender aqueles títulos antigos?


 


Não faz nem tanto tempo assim, em 2016, o Brasil tinha uma Selic de 14,25% ao ano. O retorno era alto, em aplicações com ótima liquidez e baixo risco. Para a superintendente Acadêmica da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), Luciana Machado, no mundo dos investimentos, a sorte de entrar nas aplicações no tempo certo faz toda a diferença.


 


É difícil acertar o melhor momento, mas quem comprou títulos públicos antes do ciclo de redução de 2016 até agora se deu bem. Hoje esses papéis valem muito. Sempre paira a dúvida se este é ou não o momento para se desfazer desses títulos e aproveitar os ganhos ou manter os contratos com boas taxas.


 


A especialista diz que pode ser uma ótima hora para liquidar os títulos, mas tudo depende do objetivo financeiro de cada um.


 


“É importante ter em mente que depende do que vai se fazer com o dinheiro. Se for para consumo imediato, comprar um carro, por exemplo, vale a pena. Se acha que vale a pena ir para renda variável, que tem um bom prospecto agora, também pode ser uma boa ideia.


 


Mas se pensa em reinvestir na renda fixa ou Tesouro não é uma boa opção porque terá taxas mais baixas que antes”, afirma.    


 


Em resumo:  


 


- Quer liquidar para aplicar em renda variável e aumentar o patrimônio? Sim, hora de vender.


 


- Quer liquidar para aplicar em renda fixa com juros mais baixos que os anteriores? Não venda, segure.


 


- Quer guardar o dinheiro para longo prazo, como aposentadoria? Não venda, segure.    


 


E a reserva de emergência, hein?


 


Todos precisamos de uma reserva para imprevistos, coisas que o nosso planejamento, por mais cuidadoso que seja, não dá conta. A reserva de emergência deve ficar numa aplicação de liquidez diária, em que você pode tirar o dinheiro a qualquer momento sem prejuízos.


 


“Reserva de emergência não foi feita para ganhar dinheiro ou aumentar patrimônio. Você tem que ter seis meses do seu salário guardado, deve poder ter acesso fácil a esse dinheiro e buscar o menor custo para mantê-lo guardado. Por isso, é recomendado colocar no Tesouro Direto (Tesouro Selic) ou fundos DI com taxa zero”, afirma o Pedro Lula Mota, economista e gerente de portfólio da Vérios, plataforma de investimentos.


 


Segundo ele, você pode até ter debêntures (títulos privados) ou LCI, mas precisa ficar atento aos prazos, para garantir boa liquidez. Outra opção cada vez mais popular são as carteiras digitais que rendem 100% do CDI, como Nubank e PicPay.


 


Para o planejador financeiro Jayme Carvalho, CDBs com liquidez diária também são uma boa pedida para a reserva de emergência, assim como títulos ou fundos que acompanham o CDI.


 


Prefixados e até títulos atrelados à inflação apresentam risco de variação nos juros e não são recomendados para a reserva de emergência.    


 


Fundos multimercados


 


Luciana Machado, da Fipecafi, afirma que, para quem está começando a tomar mais risco, os fundos multimercados são uma boa maneira de diversificar.


 


Normalmente, esses produtos têm ativos que vão de moeda estrangeira, a ações e até títulos públicos. Tudo para equilibrar os riscos e a rentabilidade. Busque aqueles de baixo risco, se estiver começando a enveredar por esses caminhos um pouco mais agressivos. Sempre fique atento ao preço da taxa de administração e de performance do fundo.    


 


Fundos imobiliários


 


Tem muita gente que pensa que os fundos imobiliários são renda fixa. Mas eles são renda variável e possuem diversos ativos, além dos “tijolos” (shoppings e salas comerciais). Em geral, quando a Selic cai, o preço desses títulos sobe, porque eles se tornam mais atrativos.


 


Ultimamente, o custo inicial para aplicar nesses fundos vêm se valorizando, porque o ativo vive um verdadeiro “boom”. Mas de acordo com Luciana, ainda há espaço para retornos interessantes, com ganhos acima do CDI. Vale lembrar que esses retornos são isentos de imposto de renda.    


 


Ações e ETFs


 


O economista da Vérios, Pedro Lula Mota, comenta que os fundos de índice, negociados em bolsa, mais conhecidos pela sigla em inglês ETF, estão crescendo no Brasil. Esses investimentos, diz ele, já são bem difundidos mundo afora, mas só agora, com a taxa de juros na mínima histórica, estão ganhando força por aqui.


 


“Para quem quer começar a investir em ações, eu recomendaria ETFs. Você pode ter aplicações de R$ 100, R$ 200 e você se expor ao Ibovespa ou a um índice de Small Caps (empresas menores listadas em bolsa). Ele tem um custo muito baixo e tem muita liquidez. Eles são uma boa porta de entrada para que está começando”, afirma.


 


No atual cenário de estímulo à economia com o corte da taxa de juros, o sócio da Monte Bravo, Rodrigo Franchin, afirma que os papéis ligados à economia interna, como varejistas, saúde e educação, têm mais chance de se valorizar. Para ele, ações menos vulneráveis às variações de humor do exterior se mostram um pouco mais seguras para o momento.


 


“Os primeiros a receberem a devolutiva de crescimento vão ser os varejistas”, afirma. Ele defende ainda que, com mais dinheiro no bolso, o brasileiro também tende a gastar mais com saúde e educação, dois setores que têm muito espaço para crescer.    


 


Dólar


 


Apesar de ver o momento como bom para se arriscar, Franchin não aconselha investir em dólar no atual patamar de R$ 4,20. “Não indicaria a entrada em dólar. Você tem uma moeda muito alta, com tendência de não aumentar tanto, agora que o coronavírus ficou mais controlado. Além disso, ativos brasileiros podem se tornar atrativos e acabar trazendo mais dólar para o país, naturalmente derrubando um pouco o preço da moeda”, avalia.    

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